O filme de 2012, dirigido por Joe Wright, é inspirado no clássico da literatura russa de Leon Tolstoi. A trama é desenvolvida na década de 1870, contando a história de Anna Arkadyeyna Karenina (Keira Knightley), uma mulher casada com Alexei Karenin (Jude Law) e apaixonada pelo conde Alexei Vronsky (Aaron Johnson).
Este filme trouxe o Oscar de Melhor Figurino em 2013 para sua figurinista e, apesar de ser bastante controverso, é um dos meus figurinos favoritos graças à forma que traduz inúmeros detalhes da trama.
Jacqueline Durran não utiliza as vestimentas de forma literal em relação à época, ela decidiu misturar elementos da década de 70 do século XIX e da década de 1950, essa relação se tornando clara com a utilização de saias estreitas e anquinhas, representações claras de 1870, além de a silhueta de 1950 marcada pelos corpetes e as saias rodadas. Apesar de serem silhuetas diferentes, elas são utilizadas perfeitamente, marcando os papéis sociais do enredo.
Cada personagem possui identidades de vestimentas muito diferentes, exatamente por isso, vou detalhar apenas Anna.
“Esta [Anna] não estava vestida de lilás, como tanto teria desejado Kitty. Um toilette de veludo preto, muito decotada, desnudava-lhe os ombros esculturais, que lembravam velho marfim, assim como o colo e os braços roliços, de pulsos finos. Rendas de Veneza guarneciam-lhe o vestido. […] Kitty, fascinada, todos os dias, em imaginação, via Ana vestida de lilás. Mas só agora, ao vê-la de preto, percebia que não apreendera todo seu encanto. Via-a sob um aspecto novo e inesperado. Agora compreendia que o lilás não lhe ficasse bem. O seu grande encanto resultava precisamente desse relevo de sua personalidade. O que vestia passava despercebido. Enquanto um vestido lilás a teria exibido, este, ao contrário, não obstante as suntuosas rendas, era apenas uma moldura discreta que lhe punha em evidência a inata elegância, o encanto, a perfeita naturalidade.”
Anna Karenina - Leon Tolstoi (capítulo XXII, parte 1)
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O figurino desta personagem é próprio de destacar sua personalidade e originalidade, sendo evidente desde o começo do filme, durante o baile mencionado no trecho anterior. O tal vestido preto representa perfeitamente quem Anna é neste momento da narrativa, utilizando uma cor simples, realçando sua beleza e marcando sua posição como mulher casada, de classe alta e fiel ao marido. Um outro aspecto interessante desta peça é sua assimetria, onde parece que a qualquer momento seu vestido irá cair graças à fragilidade das alças e a construção do tecido, representando a vida confusa e ‘torta’ da personagem, além de adiantar seus conflitos internos por se apaixonar por Vronsky. Estes fatores se contrastam com o restante do baile, uma vez que as outras jovens vestem o mesmo vestido em diferentes cores de pastel.
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Outra peça que merece destaque é o vestido vermelho utilizado durante uma festa na casa da Princesa Betsy. Sua vestimenta é muito parecida com o vestido anterior, porém este parece que está se desmanchando ainda mais, além de aparentar estar amarrado em sua cintura. Exatamente neste momento a personagem decide se arriscar em um romance com Vronsky.
Durante sua jornada com seu amante, Anna está sempre com roupas brancas, representando momentos em que ela se vê casada, mesmo a sociedade não concordando com tal afirmação. A cor também demonstra a calmaria em que a personagem está neste momento.
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Não posso deixar de mencionar todos os acessórios que Anna utiliza em sua trajetória: todas as jóias são da marca Chanel com características do período em que se passa na trama, ainda contando com características contemporâneas. Contudo, o que mais gosto no trabalho que Jacqueline Durran com os acessórios é a utilização de véus, uma vez que estes são utilizados para ocultar os verdadeiros sentimentos de Anna e quem ela realmente é diante de uma sociedade em que as aparências são tudo que realmente importa. A utilização do véu é especialmente importante em uma cena onde ela chega em casa e chora ainda vestindo sua ‘máscara’, deixando evidente que a personagem não possui liberdade para se expressar nem ao menos em sua casa.
O trabalho de um figurinista é auxiliar na construção de uma narrativa, muitas vezes chamando atenção para questões que não são ditas. Jacqueline Durran exerce este trabalho perfeitamente, onde conseguimos compreender perfeitamente os sentimentos dos personagens no decorrer do filme. O que mais me encanta é a forma como ela utiliza as cores para contar sua história, sendo a paleta da principal extremamente restrita, apresentando apenas três cores: preto, representando sua posição social e compromisso com seu casamento; branco, sendo a calmaria; e o vermelho, utilizado em momentos de decisões com grande peso emocional, demonstrando sua perturbação.
É incrível entender a maneira como Durran elabora esta história, o jeito que trabalha com as cores, com cada acessório e com a construção de cada uma das roupas e vale muito a pena assistir este e seus outros trabalhos.
Qual filme possui seu figurino favorito?
Escrito por Luiza Ribeiro
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